Os paradoxos, ou “aporias”, de Zenão de Eléia repousam sobre um paralogismo a respeito do movimento como sendo coisa divisível na realidade própria, pois é bastante óbvio que o percurso de qualquer objeto que se movimenta é indivisível a não ser na imaginação, já que não sofre solução de continuidade.
Desta maneira, Zenão supunha, ou pretendia supor, que uma seta lançada em direção ao alvo poderia ter o seu movimento secionado na metade do percurso, e, logo em seguida, o restante do movimento secionado na metade, e assim continuamente, ad infinitum, e continuar sendo o mesmo movimento. Entretanto, um movimento contínuo não admite ser dividido desta forma arbitrária, apresentando-se sempre como unidade indivisível, e tornando-se, a cada interrupção, um outro movimento.
Em suma, o que Zenão fazia supor era que a flecha percorria o caminho até a metade em direção ao alvo e parava. Em seguida, recomeçava o seu movimento, indo até a metade do percurso restante e parando. E prosseguia, desta maneira, sem nunca chegar a atingir o alvo. É verdade que se a flecha procedesse deste jeito estranho, cessando e recomeçando a sua trajetória a cada metade de um percurso, ela jamais atingiria o alvo. No entanto, seus movimentos sucessivos, que não seriam um único movimento, iriam se apresentar cada vez menores, até se tornarem imperceptíveis ao olho humano, em seguida aos microscópios comuns, e, por fim, absolutamente imperceptíveis. Pois o espaço, secionado e medido desta forma, é infinitamente divisível.
O mesmo se dá com o paradoxo conhecido como “Aquiles e a tartaruga”, uma corrida singular. Aqui, a suposição a priori é que partindo a tartaruga no mesmo instante em que Aquiles, mas de uma certa distância a sua frente, ou seja, mais próxima do local assinalado para chegada (digamos que a vantagem da tartaruga seja de cinquenta metros), Aquiles percorre a metade da distância (vinte e cinco metros), enquanto que a tartaruga avança um pouco. Caso os dois fizessem uma parada neste instante, e em seguida reiniciassem a corrida, com certeza Aquiles jamais alcançaria o quelônio. Este, por outro lado, também não atingiria nunca o objetivo, embora parecesse aproximar-se dele cada vez mais — seus avanços tornar-se-iam imperceptíveis, pois o espaço pode ser secionado ao infinito. Entretanto, não é o que acontece com nossos dois competidores na realidade, uma vez que eles não param nunca. Logo, Aquiles não percorre jamais a metade do caminho, ou um terço do caminho, ou qualquer outra divisão deste, mas ultrapassa continuamente todos estes pontos.
Levando este raciocínio ao extremo, podemos imaginar que a tartaruga permanece parada, sem mover-se um centímetro para a frente. Ainda assim, se Aquiles corresse em sua direção somente até a metade do percurso e fizesse uma parada, recomeçando depois a proceder da mesma forma, jamais a alcançaria. Nem mesmo em um bilhão de anos, apesar da total inatividade do animal.
Por
este motivo é que as aporias de Zenão parecem funcionar, forçando-nos a
visualizar o movimento como se fosse uma linha estendendo-se no espaço, o qual
pode ser imaginado como no ato de visualizar a trajetória da flecha ou da
tartaruga. Tal linha, uma vez estendida e fixada na imaginação, pode ser interrompida
onde bem se quiser. O próprio tempo, contudo, não admite estes estratagemas. Não
se pode visualizar um segmento temporal com inicio, meio e fim. O tempo está
fora do reino da imaginação, ao contrário do espaço. O tempo não pode ser
imaginado. Mas, quer nos voltemos para o inicio da ação (passado), ou para o
seu final (futuro, ainda não ocorrido), tudo o que vemos em nossa imaginação,
no presente o vemos.
José
Cassais
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