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sábado, 4 de maio de 2013

Edwin Muir - A Estrutura do Romance

Muir divide os romances em cinco espécies principais: romances de ação, de personagem, dramáticos, de crônica e epocal. Além destes, menciona também um tipo de romance que se preocupa apenas em narrar uma sucessão de eventos ou peripécias um tanto desconexos, mas interessantes, porém só consegue mostrar um representante da espécie, The Famous Histories of Dr. Faustus, versão inglesa.

O romance de ação é aquele em que o personagem, ou as personagens, não são muito desenvolvidos, o que importa mesmo é a sucessão de acontecimentos. Não que não haja personagens relevantes, porém eles não são relevantes em si mesmos, e sim em relação ao curso da ação. Muir cita como exemplos desta espécie, A Ilha do Tesouro, de Stevenson, e Ivanhoé, de Scott.

O romance de personagem é o contrário do romance de ação: nele, os personagens é que são importantes, e a ação tem um papel irrelevante. O que interessa é apresentar as personagens mais interessantes, definir suas personalidades. Muir cita, como representantes desta espécie, Roderick Random, Tom Jones, Martin Chuzzlewit. Todavia foi Vanity Fair, de Thackeray, o exemplo máximo deste estilo, pois neste romance o autor rompeu de vez com a trama. Nele é somente do desenrolar dos acontecimentos sociais que surgem os incidentes, com praticamente nenhuma manifestação de algo que se possa chamar de enredo. 

O romance dramático é na verdade o romance de interação, ou seja, nele os personagens e a ação não estão separados, mas interagem, modificando-se e modificando mutuamente um ao outro. Parece que, de acordo com a visão de Muir, o romance dramático incorpora o de ação, e ele passa a ocupar-se apenas daquele, e, como oposto a ele, o romance de personagens. A diferença essencial entre os dois é que o romance de personagem se desenvolve no espaço, não se encontrando nele uma consciência da passagem do tempo (ou do tempo psicológico). Seu principal objetivo é montar um painel da sociedade humana, com seu variado plantel de personagens que se movimentam por um amplo espaço geográfico — porém não de uma sociedade específica, e sim da sociedade em geral. Já o romance dramático está confinado a um espaço limitado, pois nele o fim é tornar conspícua a passagem do tempo no qual se desenrolam os dramas da vida, propriamente ditos. O destino inelutável só pode manifestar-se no tempo, como a música, enquanto que o romance de personagem, com sua dependência do espaço físico, têm estreita afinidade com as artes plásticas, como a pintura e a escultura.

O romance de crônica é uma espécie do romance dramático, apenas que naquele a passagem do tempo assume um caráter mais objetivo, ou seja, a ação se encerra num período convencional, o do tempo medido por calendários, em longos intervalos, com o objetivo de mostrar os grandes ciclos da vida em que os personagens nascem, crescem, envelhecem e morrem, e as sucessões das gerações.

O romance epocal concentra-se, como o próprio nome esclarece, em uma época especifica, num determinado lugar. Tal objetivo leva, inevitavelmente, a que o autor se especialize naquele período específico, produzindo uma obra que tem muita afinidade com o jornalismo informativo, com descrições técnicas minuciosas; e segundo Muir esta é, de todas as formas do romance, a mais desprovida de qualidades interessantes. Procurando mostrar uma imagem da sociedade, ainda que esta seja apanhada em um período muito limitado, o romance epocal teria afinidade com o romance de personagem.

É muito interessante a maneira como Muir vê a manifestação artística, como uma limitação auto imposta do artista, concentrando-se em apenas um aspecto da realidade, ou em uma de suas categorias, afixada ao tempo, ao espaço, ou a alguma de suas manifestações, objetivando a apreensão do sentido por trás das aparências, numa espécie de cristalização da realidade em oposição ao fluxo indeterminado de consciência no qual nos encontramos imersos e pelo qual somos arrastados, experimentando apenas flashes de realidade, ou de consciência, estourando aqui e ali.


José Cassais


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